terça-feira, 5 de julho de 2011

LIVRO I – O NASCIMENTO DO FILHO DO INVERNO - CAP I

Crepitava a brasa da fogueira, enquanto dançava a chama erguendo-se para os céus. O brilho que o fogo causava iluminava os olhos da jovem mulher. Seu nome era Enômis, uma recém adulta da tribo Gildan, órfã de pai e mãe criada pela tribo como uma filha de todos. Era comum esse tipo de relação nessa tribo bárbara, muitos eram os que não possuíam pais em função das lutas com outras tribos ou contra os monstros que habitavam a região.
Enômis era jovem, sua pele como dos demais era branca do tipo que nunca conheceu o sol, pois, nas terras do gélido sul de Nervanda as nuvens sempre estavam encobrindo o firmamento e o vento frio, vindo do oceano, mantinha todos os cantos da região coberto por neve. Os olhos da mulher eram azuis de um turquesa sem comparação, seus cabelos eram negros e compridos chegando a bater na cintura, seu corpo magro padecia com o frio, pois as mulheres não podiam se alimentar direito, já que a maioria do alimento devia ficar para os guerreiros da tribo mantendo-os fortes para enfrentar os perigos.
Naquela noite, a jovem não conseguiu dormir por algum motivo, então procurou conforto perto de uma das fogueiras acesas para espantar o frio. Junto a ela haviam outros tantos bárbaros e mulheres aquecendo seu corpo, seja por não poderem dormir ou por não quererem fazê-lo, tendo em vista que o sono poderia ser fatal em um local tão hostil quanto aquela planície congelada.
A tribo de Gildan era composta por nômades que andavam sempre a procura de alimento, tão escasso na região. Porém, os barbáros normalmente sobreviviam da pesca, pelo tempo que conseguiam ficar em local seguro, longe de outras tribos ou animais atraídos pelo aglomerado de pessoas e seus alimentos. Apesar de uma tribo rústica, os Gildan eram organizados e mantinham certa hierarquia na tribo, todos respeitando um código de leis próprias regidas pelo sacerdote que se denominava Xulclan.
O Xulclan da vila chamava-se Narghal e era a pessoa mais próxima de Enômis, quase como a figura de um pai para a garota. Ele sabia que sua filha se tornara mulher há poucos dias e em breve deveria cumprir as tarefas as quais fosse incumbida, inclusive o matrimônio com um dos guerreiros da tribo. Contudo, Narghal não cuidava de Enômis pelo simples fato de simpatizar com a garota, ele sabia que ela era especial.
Sempre que uma pessoa nasce na tribo o Xulclan pega o bebê e o mergulha no oceano de gelo em uma espécie de batizado onde a criança recebe seu nome e seu animal protetor. Logo quando ocorreu a vez de Narghal mergulhar Enômis ele cometeu um pequeno erro. Uma onda acertou o Xulclan que deixou a criança escorregar e cair dentro do oceano, de temperatura inferior a cinco graus negativos, onde permaneceu por muitos minutos até que fosse recuperada. Foi quando o mais espantoso aconteceu: a criança que nascerá de olhos negros quando retirada do mar, sorria sem demonstrar sinal de frio ou medo e seus olhos agora eram turquesa como o céu de uma manhã, que nunca ninguém ali presenciou.
Narghal escondeu o fato de todos da tribo, pois na prática do ritual ele permanecia só com a criança e nem mesmo os pais podiam vê-la antes do batismo. Logo, sem a companhia de nenhuma outra pessoa, o Xulclan foi o único a presenciar o fantástico acontecimento. Então, anos depois, com a morte dos pais de Enômis em um combate entre tribos, Narghal passou a protegê-la e vigiá-la por todos os dias.

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